Vão dizer que isso já virou palhaçada. Esta é a segunda vez que eu me saio com uma história de curió acontecida dentro de ônibus, mas eu juro que é a mais pura verdade. Dessa vez, aconteceu na linha Volta ao Morro Carvoeira, Saída Norte.
Quando entrei, o ônibus estava praticamente vazio. Para fugir do Sol, sentei na poltrona do lado esquerdo, atrás do cercadinho que limita os assentos destinados às senhoras grávidas, aos idosos e deficientes físicos. Em seguida, o ônibus saiu. Naquele ponto do Instituto Estadual de Educação, um homem entrou com uma gaiola na mão. Eu já me aprumei no assento. Esse era bem mais jovem do que aquele e estava vestido direitinho, mas, a exemplo da outra, a gaiola também estava coberta, dessa vez, por uma camiseta. Até aí tudo bem. Havia vários lugares vagos no ônibus, mas o indivíduo entendeu de sentar no tal reservado e se aboletou exatamente no banco em frente ao meu. Eu sorri internamente, pensando: lá vem uma crônica prontinha; é só o trabalho de descrever a cena. Pois não deu outra.
Com “pompa e circunstância” o tal do homem instalou o curió no canto da janela e, espremido, sentou-se no canto do corredor. O povo entrando, que gente brota não se sabe de onde, alunos com suas imensas mochilas, donas-de-casa carregando sacolas do Direto do Campo. Gente alta, gente baixa, gente magra e gente gorda. Todo mundo que entrava, olhava para a gaiola com cara de censura e o homem nem aí. Eu, ouriçada, à espera do desfecho da crônica. Posagora! O meu ponto quase chegando, eu decidida: vou até o fim da linha, mas essa eu não perco.
Nem precisei ir tão longe. No ponto da Praça Celso Ramos uma mulher entrou e já veio com cara de arrenegada. A verdade é que até havia lugar na “cozinha” do ônibus porque muita gente saltou naquele ponto, mas a dita parecia achar que aquilo era uma questão de afirmação da superioridade humana sobre todas as criaturas. Lançou um olhar irônico em volta, como quem diz, “Vocês vão ver, seus tanso”, olhou para o tal do homem e disse cheia de autoridade: “_ ’cença?”.
O homem nem respondeu. Levantou, ergueu a gaiola para a mulher passar, sentou-se e, antes que ela pudesse comemorar, colocou a gaiola sobre o colo, ou melhor, sobre os colos, o dele e o dela. Para não dar o braço a torcer, a tal mulher viajou até a Trindade com o curió no colo. Pelo menos até a minha parada, que o que aconteceu depois eu não vi.
1 x 0 pro curió. Porque mais do que isso, só se ele pudesse voar livremente.
* os nativos apreciam muito os “Colerinhas” e também os levam a passear pelas ruas da cidade, mas, sem dúvida, na Ilha o curió é soberano…